CONTOS E CIA

Um pouco de teorização

O CONCEITO DE NARRATIVA
É importante para o nosso trabalho. Utilizando-nos dos conceitos de Siqueira, poderíamos dizer que o que distingue uma narrativa de um mero relato é o fato de, na primeira, termos uma expectativa, que permite ao leitor reconhecer o conflito, a principal característica da narrativa. Portanto, "...quando o fato se desenvolve a partir da criação de um conflito, temos uma narrativa"; "...quando o fato se desenvolve por meio de uma simples sequência de ocorrências factuais, temos um relato." (João Siqueira, 1992, p.14).

ESTRUTURA DO TEXTO NARRATIVO
-Situação de equilíbrio
-Fator qualquer de desequilíbrio
-Solução
-Novo equilíbrio
A narrativa se inicia com um equilíbrio e este é quebrado, seja pela introdução de um elemento mágico, seja pelo falecimento ou afastamento de algum personagem. Essa quebra de equilíbrio gera o conflito, e a narrativa desenvolve-se na busca de uma solução. Uma vez resolvido o conflito, o equilíbrio que se restabelece não é mais o mesmo, embora possa ser parecido com o inicial. * podendo ocorrer no mesmo texto um ou mais trinômios desse tipo. Linguagem predominantemente de acordo com o padrão culto, formal ou informal, da língua.


ELEMENTOS DA NARRATIVA
1. Personagens: Número reduzido de personagens (caracterizá-las :altura, cor dos cabelos, dos olhos etc., e aspectos psicológicos de tipos humanos)
2. Enredo: apresentação, complicação, clímax e desfecho
3. Narrador (foco narrativo adotado: em 1ª ou 3ª pessoa. Se for em 3ª, ele pode saber tudo, se for em 1ª, depende da sua atuação dentro do enredo. ) -narrador-observador ou narrador-personagem
4.Tempo (atenção para o fato de que acontecimentos e ações têm, necessariamente, uma duração. )
5. Espaço (devem ter uma função determinada no texto, ou seja, devem manter com a trama uma relação significativa. )
6. Ambientação - socioeconômicos
7. Discurso
8. Aspectos psicológicos, morais, religiosos
9. Simbologia


O CONTO
No Século XIX o conto se distancia da novela e do romance adquirindo espaço próprio. Grandes contistas surgem no mundo inteiro: Edgar Allan Poe nos EUA, Maupassant na França, Eça de Queirós em Portugal e Machado de Assis no Brasil. Alguns críticos chegam ao requinte de firmar uma distinção numérica entre o que chamam de ‘conto-curto’ (‘short-short history’) e ‘conto longo’(long-short story’): aquele teria cerca de 500 palavras, o segundo, entre 500 e 15.000 a 20.000 palavras. Para Moisés, conto é, do prisma de sua história e de sua essência, a matriz da novela e do romance. ( p. 37) Segundo o autor, o conto tem uma unicidade dramática, uma célula dramática, uma única ação que centraliza os fatos em torno da narrativa. O romance tem diversos núcleos que interagem entre si, ou não, o que aumenta sensivelmente o número de personagens, cenários e, consecutivamente, o número de páginas.
(MOISÉS, 1994, p. 23) .

Para Kaiser existem dois aspectos importantes sobre o conto: seria uma espécie de narrativa oral; o caráter individual do conto deriva da necessidade do autor de falar de si próprio (Kaiser, 1968, p. 272).Teles afirma que os primeiros autores de livros de conto não faziam questão de distinguir entre os contos que pertenciam à tradição (e que estavam, portanto, incrustados na língua) e os que pertenciam à sua própria criação, como produtos de uma fala literária. Todos os livros de contos a partir do século XV misturam as duas formas: os de "forma simples", ligados à tradição popular; e os de ‘forma culta’, criados pelo escritor.

O conto literário não é simplesmente recolhido da tradição; ele é criado ou produzido pelo escritor e, como tal, é organizado em livro, codificado numa linguagem muito próxima da linguagem poética e cujas “leis” o crítico, o estudioso da literatura, deve procurar e descobrir. (Teles, 1979, p. 288 - 290) Moisés acrescenta: Como ‘forma simples', o conto entranharia no folclore, aproximando-se da fábula e do apólogo, ou no universo das ‘histórias de proveito e exemplo’, do mundo de fadas, da carochinha, e continuaria a ser cultivado mesmo depois do século XVI, pela mão de La Fontaine. E como ‘forma artística’, o conto seria o literário propriamente dito, por apresentar autor próprio, desligado da tradição folclórica ou mítica para colher na atualidade os temas e as formas de narrar.
(Moisés, 1994, p. 33) .

Por esses aspectos, Kaiser (1968) afirma que todas as formas simples podem se transformar em contos.

Na estrutura do conto há:
um só drama,
um só conflito;
rejeita as digressões;
rejeita as extrapolações.
busca um só objetivo, um só efeito.


Com isso, a dimensão do conto é reduzida: o autor usa a contração, isto é, a economia dos meios narrativos. Essa preferência pela concisão e a concentração dos efeitos torna o conto uma narrativa curta.

Características: pequena extensão e pouca variação espacial e temporal, poucos personagens e sem complexidade
Uma característica importante é que ele termina justamente no clímax, ao contrário do romance em que o clímax aparece em algum ponto antes do final.
O espaço físico da narrativa normalmente não varia muito devido à própria dimensão do conto. A variação temporal não importa: o passado e o futuro do fato narrado são irrelevantes.
Caso seja necessário, o contista condensa o passado e o expõe ao leitor em poucas linhas. Devido a essas características o número de personagens que participam do conto é pequeno. Também não há espaço para personagens complexas: a ênfase é colocada em suas ações e não em seu caráter.
É claro que essas características do conto podem variar de uma época para outra, mas essas variações ocorrem em maior ou menor grau constituindo sempre uma estrutura básica que configura o gênero.


"[...] O conto aparece como amostragem, como um flagrante ou instantâneo, pelo que, vemos registrado literariamente, um episódio singular e representativo."
(Soares, 1977, p.54).

Contos: populares, de ensinamento, de fadas, fantásticos, maravilhoso, de encantamento, de aventura, de terror, religiosos ou morais, piadas, de animais etc. , vamos diferenciar o conto maravilhoso do conto de fadas, pois ambos fazem parte das narrativas maravilhosas.

Contos de Fadas
De origem celta, os contos de fadas apresentam uma problemática existencial: o herói ou a heroína precisa vencer obstáculos ou provas para alcançar sua auto-realização, por exemplo, o encontro do príncipe e a princesa em A Bela adormecida, ou o encontro do seu verdadeiro eu, como em A Bela e a Fera. Geralmente a aventura da busca parte de uma metamorfose ou de um encantamento.

Contos Maravilhosos
Já os contos maravilhosos originam-se de narrativas orientais. Diferente dos contos de fadas, sua problemática é social: o herói ou anti-herói encontrará sua auto-realização na conquista de bens e de poder material como em "Ali Babá e os Quarenta Ladrões". A aventura de busca, nesse caso, parte, geralmente, da necessidade de sobrevivência física ou da miséria dos protagonistas. Assim, embora narrativas maravilhosas, o conto de fadas e o conto maravilhoso expressam atitudes bem diferentes diante da vida: no primeiro, ligadas ao ideal, aos valores eternos, ao espírito; no segundo, ligadas ao sensorial, ao concreto, à vida prática.

PERSONAGENS
O personagem é um elemento fundamental para qualquer obra dramática, afinal sem ele não conseguiríamos construir uma narrativa.

Ficha de Identidade do Personagem




(...) abre a porta do irracional, isto é, do mistério, da magia, do acaso, do maravilhoso, do sobrenatural, onde se encontram as forças do Bem e do Mal; mas fica-se também mais perto do inteligível (sic); a distância no tempo e no espaço produz o efeito de exotismo, de desproporção das dimensões (o monstruoso), das quantidades (o enorme) e das noções (o incrível).
(Patrick Charaudeau .1992. )


Miniconto, ou microconto, ou nanoconto, é uma espécie de conto muito pequeno que pretende contar uma historia através de uma situação (ou não), mas que de alguma forma desperte sentimentos no leitor.

...não dá uma ideia de que a literatura se mede pelo número de palavras ou pelo peso do fascículo. Como se houvesse ficção ou prosa a metro ou ao quilo...........Quando falamos em contos, imaginamos textos com mais de seis páginas, imagens, linhas temporais, células dramáticas etc.

O micro -conto é um gênero que a modernidade resgatou. Há registros de fábulas chinesas milenares que podem passar muito bem por microconto.

“Vamos pensar juntos, um pouquinho mais, sobre estes micro contos.” - 53 toques, mas não é um micro conto.....


Quais são as características do microconto?
São palavras escolhidas, colocadas ali para o encantamento poético, com possibilidades semânticas. O circunstancial e o universo se comunicam para você ler é entender, mas onde o irracional se faz transparente. Um texto conciso, o que não significa pobreza.

De fato , magicamente, eles têm uma história, uma ação, um sentimento. Uma imagem vem a mente, a imaginação do que se sucede ou do que aconteceu antes...

O microconto, como qualquer ficção curta, tem de pegar o leitor de cara, com recursos expressivos capazes de interessá-lo a seguir o desenvolvimento da história até chegar a uma reviravolta que provocará a surpresa e que geralmente é o objetivo do escritor.

Em nome de uma “estética da brevidade”, se trata de um gênero que vem ao encontro de nossa vida louca: culto da velocidade e cultura do impacto. O tempo é o grande desafio da vida urbana atual.

Mas, eis a velha e renitente questão da classificação dos gêneros, mesmo os novos...... podemos entender os microcontos de muitas formas:

como um aforismo,
como um provérbio
como um slogan,
como uma crônicas,
como um poemas,
como uma anedotas......

Dessa forma, ao ler um microconto, podemos valorá-lo não por ser um jeito representativo de escrita, um jeito contemporâneo de escrever, um jeito "certo" de escrever, mas sim, pelo modo como eles nos chocam e nos espantam. Ao ler um microconto, devemos nos questionar até que ponto ele pode ser um slogan, um provérbio ou um aforismo: Até que ponto um microconto é o produto de um mundo onde a cultura midiática impera, onde a propaganda e a publicidade são leis, onde a sedução é rainha?  Até que ponto um microconto é aquilo que já existe, o senso comum, a verdade geral e idiota, o bom senso encarnado? Até que ponto um microconto é um aforismo, carregado de dualidades, carregado de paradoxos que nos questionam, nos fazem ver o que não queremos, nos fazem pensar?” Dá para comparar um microconto a uma boa piada. Esta não pode ser comprida demais senão a atenção de quem a ouve vai para o espaço. Há uma história, na anedota, que pega o ouvinte de cara, desenvolve-se e fecha com uma frase surpreendente ou por uma situação inesperada dos personagens, provocando o riso pela surpresa.

 ‘VISITA’
Não bateram na porta
Arrombaram
 Francisco Alvim  (de Lago, Montanha)

‘MAS’
é limpinha
Francisco Alvim

‘ÓRFÃO’
Sou.
De muitos pais, de
muitas mães”
Francisco Alvim  (de Elefante).

que tudo se foda,
disse ela,
e se fodeu toda”
Paulo Leminski (de La Vie em Close).

‘SINA’
 o amor que não dá certo sempre está por perto”

‘ORGULHO’
decresça e apareça.
Cacaso, de Beijo na Boca (1975)

‘ASSIM’
Ele jurou amor eterno.
E me encheu de filhos.
E sumiu por aí.”.
Luiz Ruffato
Lá no caixão...
– Sim, paizinho
– ...não deixe essa aí me beijar
Dalton Trevisan

 ‘CRIAÇÃO’
 No sétimo dia, Deus descansou.
 Quando acordou, já era tarde.
Tatiana Blum.
‘QUEM’
Sim, doutor, eu estou louco.
Mas quem é esse
que diz eu estou louco?
Sérgio Sant’Anna

ADEUS
Então disse:
 – Viver era isso?
 E fechou lentamente os olhos.
Miguel Sanches Neto

‘MAS O RIO CONTINUA LINDO’
 Pensa o desempregado
 ao pular do Corcovado.”
Antônio Torres

Os microcontos aqui apresentados são contos ou poemas?
Enfim, poemas bastante precisos, que poderiam ser tidos como MICRO-CONTOS, e que parecem conter mais poder de síntese, concisão, mais humor e mesmo mais “ação”, no sentido dramático, do que muito conto.

Referências:
http://www.microcontos.com.br/
"Micro-contos ou micro-poemas?"
www.digestivocultural.com

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Grata pela sua participação.
[]s.
Katty Rasga