quarta-feira, 28 de julho de 2010

O leitor segundo Barthes

Segundo Barthes (1977), o leitor pode ser comparado a uma aranha: à medida que tece sua teia, segrega a substância com a qual a fabrica, ou seja, ele projeta sobre o texto todo seu conhecimento de mundo. Daí, vê a leitura como construção de subjetividades, na qual envolve preferências, escolhas e, como diz Daniel Pennac (1993:139), direitos. Direito de pular páginas, de ler primeiro o final, de escolher qual livro ler e até mesmo de não ler.

A leitura é uma incessante busca da outra margem do texto, ou como afirma Roland Barthes (1996:12) “uma outra imagem, móvel, vazia (apta a tomar não importa quais contornos) que nunca é mais do que o lugar de seu efeito: lá onde se entrevê a morte da linguagem”, porque a primeira margem, como diz esse mesmo pensador é “uma margem sensata, conforme, plagiária (trata-se de copiar a língua em seu estado canônico, tal como foi fixada pela escola, pelo uso correto, pela literatura, pela cultura)”.

A primeira margem do texto é dada ao leitor, a segunda ele constrói. O prazer do texto se instala entre o primeiro contato, margem, e o segundo, margem a construir-se. Quando a margem perde sua estabilidade e o leitor entra em deriva, instaura-se a fruição, no vazio, na fenda, no corte; enquanto o prazer está na cultura, na segurança da margem sólida do texto, a fruição instala-se na desconstrução do pré-estabelecido. O pré-estabelecido é codificado, é social, é língua.

Para Roland Barthes (1996:19), há dois regimes de leitura: uma ignora os jogos de linguagem; a outra leitura não deixa passar nada. A primeira é rede de malha grande onde só os grandes peixes encalham, a outra é de malha fina onde todos os peixes encalham, os mínimos inclusive, e a flora marítima, o alimento do peixe também, enfim, onde o mar é pescado e em mim se instala, para que eu o povoe de peixes de minha criação.

A leitura é também comparada a um toque de mãos, uma troca de afetos. Quando duas mãos simplesmente se tocam, estabelecem uma margem de partida, de leitura, mas quando o afeto se instala na fenda que as duas abrem, uma só mão passa a existir, um momento epifânico se produz.

O texto pois, só tem vida com a dinâmica da leitura, com a presença do leitor em constante construção. Segundo Barthes (1996:21):

Texto de prazer é aquele que contenta, enche, dá euforia; aquele que vem da cultura, não rompe com ela, está ligado a uma prática confortável da leitura. Texto de fruição é aquele que põe em estado de perda, aquele que desconforta, faz as bases históricas, culturais, psicológicas, do leitor, a consistência de seus gostos, de seus valores e de suas lembranças, faz entrar em crise sua relação com a linguagem.

Assim, o texto de fruição é de ruptura, de desbordamento, de defecção. É uma “esfoladura”, nas palavras de Barthes.

O escritor é quem tem a coragem de suspender a frase para que o leitor a complete. Só suspendendo a frase consegue a fruição. É preciso saltar do barco/frase em plena correnteza para que o rio/texto se instaure no meu mergulho/nado.


de Batista de Lima http://www.revista.agulha.nom.br/batis5.html

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Katty Rasga